26 de janeiro de 2010

LIVRE-ARBÍTRIO E SOBERANIA DE DEUS

É muito comum tanto no meio evangélico como fora dele a defesa do chamado livre-arbítrio, que pode ser definido como a capacidade humana de tomar decisões livres (no sentido mais forte da palavra que se puder imaginar); fala-se desta capacidade como se isto fosse a própria essência do ser humano ou algo imprescindível à sua existência. O problema quanto a isso é que, como iremos ver, se a tal liberdade humana para tomar decisões for levada às suas consequências últimas, então acabaremos por anular algo realmente essencial própria realidade da vida.
Mais uma vez fui levado a pensar neste assunto enquanto lia “O Mundo de Sofia”, um instrutivo e interessante romance sobre a história da filosofia. Curiosamente quando fala sobre destino e idéias semelhantes, o autor comenta sobre o livre-arbítrio e, talvez sem perceber a relevância do que iria dizer, acaba fazendo uma afirmação que nos coloca diante de duas idéias que, ainda que para muitos não pareça, são mutuamente excludentes pois não podem ser, ambas, verdades.
"A última pergunta era a mais difícil. Sofia nunca tinha refletido sobre o que governa o curso da história. Não seriam as próprias pessoas? Se fosse Deus, ou o destino, as pessoas não teriam livre-arbítrio." Penso que dificilmente poderia haver mais precisão sobre um assunto tão controvertido e delicado, mas que não se pode deixar de definir.
Infelizmente, no afã de defender a suposta liberdade humana, muitos tem desprezado aquilo que tem sido tão caro aos que crêem no Deus da Bíblia, no que se refere à Teontologia ou doutrina de Deus, conforme revelada nas páginas das Escrituras, a soberania de Deus sobre todas as coisas.
Há quem diga que quando os que deveriam falar, silenciam, as pedras falam. Podemos, então considerar Jostein Gaarder como um Caifás dos tempos modernos que, o sumo-sacerdote que presidiu o julgamento de Jesus e que sem querer profetizou a morte vicária de Cristo, dizendo que convinha que morresse um só homem em lugar de toda a nação.
Segundo uma interpretação honesta e corajosa das Escrituras (e só pra resumir Moisés, Isaías, Jeremias, Jesus e Paulo dão um destaque especial ao assunto), o narrador do livro tem toda razão, ou Deus governa sobre cada parte da criação ou o homem possui o livre-arbítrio. E quanto a isto, precisamos assumir uma posição, pois não se trata de algo periférico ou pouco importante, mas daquilo que o homem é em relação ao Criador e, especialmente, da própria natureza do Deus da Bíblia e consequentemente se relaciona aquilo que aconteceu, está acontecendo e ainda irá acontecer neste mundo.
O fato é que, conforme os escritores bíblicos citados e outras tantas passagens da Bíblia às quais poderíamos recorrer, Deus governa, sim, sobre tudo e sobre todos e nada escapa ao seu abrangente domínio. Aprendemos pela Palavra que, mesmo aquelas coisas que consideramos tão naturais, como chuva, vento, neve, relâmpagos e, até, o alimento dos animais são ordenados diretamente pelo providente Deus que as Escrituras nos apresentam. Jesus chegou a dizer que sequer um fio de cabelo ou um pardal cai por mero acaso; se isto não é uma pista para nos mostrar que Deus planejou e conduz a história nos seus mínimos detalhes, então não se sabe o que é.
Mas visto estarmos tratando de livre arbítrio, sei que muitos vão reivindicar exemplos de pessoas fazendo o que Deus ordenou ou decretou e, por assim dizer, não podendo fazer outra coisa, senão isto. Quanto a esta questão, impressiona-me a ousadia de alguns que tentam justificar o endurecimento de Faraó por parte de Deus, quando a própria Escritura na segunda vez que fala sobre o assunto através de Paulo, o faz justamente para mostrar que Deus faz exatamente aquilo que quer, mesmo que isto envolva o coração e a vontade de suas criaturas; é importante ressaltar que ambos os textos falam do assunto para explicar, respectivamente, o propósito de Deus em promover a glória do seu próprio nome e, o que podemos chamar aqui, de independência de Deus; ele faz exatamente aquilo que quer e não precisa dar satisfação para ninguém, nas palavras do pagão Nabucodonosor , "não há quem lhe possa deter a mão, nem lhe dizer que fazes?"
Além de Faraó e Nabucodonosor, um outro rei chamado Senaqueribe é exposto na Bíblia como quem foi usado por Deus para realizar Sua vontade e, mesmo se arrogando de forte e invencível, segundo o próprio Deus de Ezequias, ele estava fazendo exatamente aquilo que Deus havia estabelecido, com o propósito de finalmente ser derrotado por Ezequias e glorificar o todo-poderoso. Um outro exemplo da mão invisível de Deus conduzindo a história é José que, segundo o relato de Moisés, Deus transformou em bem a inveja e maldade dos irmãos dele, mas o salmista vai além disso e declara que foi o próprio Deus quem enviou José ao Egito, o que combina com a previsão que Deus já havia feito de que eles seriam sujeitos à escravidão em terra estrangeira.
Além disso, o acontecimento mais importante de toda história, é descrito como tendo sido planejado por Deus com a maior antecedência possível, mostrando também que nem mesmo a própria queda no pecado foi um acidente ou fruto meramente da vontade livre do homem; que sentido faria, podemos perguntar, a morte de Jesus ter sido planejada em seus mínimos detalhes enquanto a queda e a morte do homem no pecado ter sido reservada a uma possibilidade? (dependente da escolha livre humana); é muito melhor ficarmos com os dados bíblicos que nos ensinam que o cordeiro (de Deus que tira o pecado do mundo) foi morto antes da fundação do mundo, o que por uma questão de lógica aponta para a realidade de que o motivo da morte do cordeiro também foi estabelecido na eternidade.
Entendo que muitos acreditam no livre-arbítrio porque acham que isto preserva Deus de ser mal ou cruel e imaginam que a não existência de tal realidade como que tira do homem a responsabilidade pelo que faz, mas pensando assim nós estamos mais uma vez rebaixando Deus às nossas próprias convenções e julgamentos e fazer isto é perder a noção de que Ele é o Criador e nós somos criaturas e não cabe a nós julgar quaisquer atitudes dele; além disso, a responsabilidade na Bíblia não é estabelecida por alguma liberdade que o homem tenha de fazer isto ou aquilo, mas pelo conhecimento que ele possui e recebe.
De acordo com a Palavra de Deus, podemos dizer sim que quem governa a história é o Senhor; e o homem, os anjos bons e ruins, os fenômenos da natureza são, sim, instrumentos também estabelecidos pelo próprio Deus para cumprirem o seu propósito. É importante destacar que isto não significa que o homem não seja livre num certo sentido e capaz de tomar decisões que afetam sua vida e a de outros; mas significa que não há qualquer possibilidade que ele seja livre de Deus de alguma forma. O homem é, sim, um ser pensante e capaz de tomar decisões importantes no que diz respeito ao seu semelhante e à criação, no entanto, como Davi confessa no salmo 139, Deus não só nos formou desde o ventre, mas também escreveu todos os nossos dias no seu livro.
Finalmente, para aqueles que ainda podem se queixar por saber que “procede do altíssimo tanto o mal como o bem” (ainda que o Senhor seja justo, santo e bom (como a sua lei) e faça tudo com um bom propósito), vale a assertiva do profeta: “Porque, pois, se queixa o homem vivente? Queixe-se cada um dos seus próprios pecados.” Ou ainda a palavra final do apóstolo Paulo em Romanos 9 sobre o assunto: “Quem és tu ó homem para discutires com Deus?! Porventura, pode o objeto perguntar a quem o fez? Por que me fizeste assim?”
Referências Utilizadas: João 11.47-52; Salmo147.8,9; Salmo 139.16;Salmo 104.19-30; Mateus 6;Mateus 1-.29-31; Êxodo 4.21;9.12; Romano 9.14-18; 2 Reis 19.25; Gênesis 50.20; Salmo 105.17; Atos 2.22,23; 1 Pedro 1.18-20; Apocalipse 13.8; Daniel 4.35; Lamentações 3.37-39.

Rev. Djaik Souza Neves
Capelão do Instituto (Presbiteriano) Samuel Graham em Jataí-GO.
Mestrando em Teologia Sistemática pelo
Centro Presbiteriano de Pós-Graduação Andrew Jumper

6 comentários:

Expedito Viana disse...

Tanto o remetente, quanto o comentário, postado em 24 de janeiro de 2010, são "anônimos" para muitas pessoas, inclusive, para mim. Que tal colocar o Adailton para "traduzir todo o conteudo anônimo" dos comentários postados neste blog??? rs... rs... rs...
Abraços,
Expedito Viana.
P.S. Este "cut-cut" é um fumaça", mas é gente muito boa!!!

Djaik Neves disse...

Tá engraçadinho esse labacheias!!!!


Grande Abraço Expedito


Pr. Adailton

Djaik Neves disse...

Falando em "cut-cut", vc viu a "criança" no Brasil Presbiteriano? Num é frac não o rapaz. kkkk
A propósito "cut-cut" (Adailton), cadê você q num nem chance da gente se falar.
Djaik

Djaik Neves disse...

Cadê vc "cut-cut"

Unknown disse...

Graaande Dieik, abraço meu jovem...

Bom, permita-me respeitosamente (tanto porque não pode desrespeitar o tio senão apanha né kkk) fazer-lhe uma pergunta/indagação, não de forma provocativa, mas porque realmente é um assunto interessantíssimo que eu sempre tive minhas dúvidas: No plano de Deus (quando digo plano de Deus, já confesso, e jamais em qualquer época e tempo poderia sequer questionar ou acreditar existir outra possibilidade)de que Deus, mesmo no controle de tudo, não nos daria corda em alguns momentos da vida? Mesmo no controle de tudo, Ele não poderia nos deixar tomar algumas decisões? Nem que seja pra quebrar a cara e voltar todos os dias com o cabinho entre as pernas, para o Seu direcionamento... Não seria o ato de Eva e Adão em comer o fruto proibido um ato de livre arbítrio, o que nos levou ao pecado? O que não afronta em nada a Soberania e o poder de Deus, pois Ele, em Sua tamanha sabedoria, às vezes, mesmo sabendo que decisão tomamos sobre determinado assunto, permite, mas sempre no comando. A bíblia diz que "arrependeu-se o Senhor de ter feito o homem na terra, e isto lhe pesou no coração", não seria pelas ações de livre arbítrio do homem? Entendo que, todas essas questões, não altera, ou não alteraria o plano de Deus, o "curso da história", ou seja, Deus age quando e como quer, deixa agir, quando e como quer, nos dá a impressão de estar "deixando rolar" mas está no controle de tudo e de todos. Mas o próprio Deus, que não tem comunhão com o pecado, nem mesmo quando o seu próprio filho amado carregou sobre sí todos os nossos pecados na cruz... Nesses momentos, não deixaria Deus por conta de outros? E em sua imensa misericórdia e poder, em questão de segundos, Ele age novamente, e resgata os seus...
Eu realmente não tenho uma posição definitiva do assunto, assim como aquelas velhas discussões sobre a predestinação... kkk. Esses dois temas, são amplos, e, acho eu, quando discutidos de forma madura, trazem mais crescimento do que dúvidas, eu penso que esses temas estão debaixo, ou abaixo da fé em Deus por meio de Cristo, e muito abaixo da misericórdia de Deus para com a humanidade.

Grande abraço meu jovem...

Seu sobrinho Cássio e Cláudia, e respectiva prole: Keila, Cássio Júnior, Vinícius e Laura (estão todos comigo aqui agora)

Djaik Neves disse...

Grande cassio, cabei de acessar seu comentário (tá mais para um artigo,kk), prometo responder com mais carinho até amanhã.. domingo é mais dificil para pastor.. abraço em ti e na prole.

Ecclesia reformata et semper reformanda est

Seguindo o princípio de nossos pais reformadores que, reconhecendo a realidade provisória da igreja em relação ao pecado, entenderam que a igreja precisava de uma reforma "radical" não só naqueles dias mas enquanto existir deste lado da eternidade, é que elaboramos este blog que tem o propósito de ensinar a sã doutrina das Escrituras Sagradas (também chamada de Teologia), pois é à luz da Inerrante e Suficiente Palavra de Deus que a igreja deve ser reformada e estar sempre se reformando, para se conformar à vontade do Dono da Igreja e alcançar a perfeita varonilidade em Cristo Jesus. Soli Deo Gloria